Archive for ‘Mulheres’

3 Junho, 2012

JÚLIA COUTINHO – MULHERES PIONEIRAS EM ENGENHARIA CIVIL

Rita Morais Sarmento / M. Amélia Chaves / Virgínia Moura

«A ciência é uma coisa perigosa para a mulher.

Não se conhece uma que por ela não

se tenha tornado infeliz ou ridícula»

Joseph de Maistre  (1753-1821)  

I – Hoje ninguém ignora que o Estado Novo, a exemplo de outros regimes ditatoriais contemporâneos[1], considerava as mulheres e os homens essencialmente desiguais. Por isso mesmo, as responsabilidades, as funções e os papéis a que tinham acesso eram igualmente distintos, reflectindo-se nos direitos cívicos e políticos, na educação e no trabalho. A Constituição de 1933 (Artº 5º) expressava isso mesmo ao estabelecer a igualdade dos cidadãos perante a lei, mas ressalvando «quanto à mulher, as diferenças resultantes da sua natureza e do bem da família», prerrogativa que servia a ideologia dominante e que, assim, mantinha a fidelização à Igreja Católica, validando as mensagens das suas encíclicas Rerum Novarum (1891) e Quadragesimo anno (1931), segundo as quais «a natureza», ao conceder às mulheres uma diferenciação na força física, as predispõe naturalmente aos trabalhos domésticos e à educação dos filhos: «é em casa antes de mais, ou nas dependências da casa, e entre as ocupações domésticas, que se encontra o trabalho das mães de família»[2].

Em Portugal, desde os finais da Monarquia, um intenso trabalho havia sido desenvolvido pelas organizações femininas de então na conquista dos direitos cívicos, legais e políticos para as mulheres[3], pugnando ainda pelo acesso destas à instrução enquanto agente emancipador determinante. O regime estado-novista não só silenciou esse trabalho e os nomes das mulheres nele envolvidas, como obliterou tudo o que de positivo a República fez neste campo, empenhando-se em criar o protótipo da «mulher do Estado Novo». Partindo da constatação da supremacia física do homem e dando crédito à predestinação encíclica da «natureza» da mulher em ser mãe e dona de casa, inculca nela o dever de governar o seu universo doméstico tal como Salazar governava o país[4]. A trilogia «Deus, Pátria, Família» será o axioma sob o qual se virá a desenvolver a «educação integral feminina» preconizada por Carneiro Pacheco e que servirá de base à criação da OMEN, Obra das Mães pela Educação Nacional, primeira organização regimental das elites femininas[5] que vai ter acção determinante nesta tarefa.

A casa será, portanto, o lugar apropriado da mulher e o mundo do trabalho ser-lhe-á restringido. Isso mesmo defende Salazar num dos seus discursos: «o trabalho da mulher casada e geralmente até o da mulher solteira, integrada na família e sem a responsabilidade da mesma, não deve ser fomentado: nunca houve nenhuma dona de casa que não tivesse imenso que fazer»[6]. Pela mesma altura, Fernando Pires de Lima proclama: «querer a Mulher, esse ser delicado por excelência, invadir profissões inadaptáveis às suas características de inteligência e resistência, parece-me atitude de muito mau gosto (…) Que honra maior pode desejar uma Mulher, do que ser esposa fiel e mãe amantíssima?»[7]. Ou seja, já não era apenas a robustez física a diferenciar a mulher do homem mas também a inteligência a torná-la inapta para quaisquer profissões.

Mas muitos outros agentes contribuíram para o mesmo fim, e aqui convém lembrar a acção que tiveram alguns escritores na manutenção do mito da «mulher ser delicado» que se pretendia recolhido, não interveniente e alheio a tudo que extravasasse as paredes do lar, pois, «dada a sua “fragilidade natural”», as mulheres, tendiam por «reacção mimética» (…) a ser aquilo que os livros lhes mostrassem» que deveriam ser[8]. Júlio Dantas, um ideólogo a quem o Estado Novo muito deve, já nos anos vinte descrevia as mulheres que decidiam trabalhar em «profissões tradicionalmente masculinas como seres “insexuados”, “criaturas moralmente disvirginizadas (…) naturezas secas, áridas, másculas, agressivas, audaciosas»[9] e, já em pleno salazarismo ao escrever o livro «As Inimigas do Homem» permite-se a seguinte dedicatória:  «”À mãe do homem”, flor de ternura e de graça que perpetuamente governará o mundo, ofereço estas páginas em que me permito sorrir das inimigas do homem, feministas revolucionárias, leaders da nova política dos sexos, por quem o mundo nunca será governado, graças a Deus»[10].  Por sua vez, Augusto de Castro quando em 1919 chegou à direcção do Diário de Notícias criou uma página que intitulou «A Mulher, o Lar, a Creança» cujos conteúdos pretendiam ser uma forma de «interessar o espírito feminino» dado que «as peripécias políticas e a agitação social» em «princípio, não lhes interessavam»[11]. António Ferro tentará reescrever a representação da mulher conferindo-lhe, nos seus escritos, sobretudo uma maior «sensação e imagem»[12] como «resposta modernista às percepções femininas»,[13] posição que não foi bem acolhida por aqueles seus pares que temiam que as mulheres deixassem de «fazer do lar o refúgio do mundo de que os chefes de família necessitavam»[14]. Como se pode verificar, Salazar teve, nos homens de letras, aliados ideológicos bastante eficazes.

Porém, e apesar do cerco que as tolhia, houve sempre mulheres ousadas que transgrediram e procuraram caminhos diferentes. E assim encontramos «escritoras, pintoras, músicas, interventoras no campo social, pioneiras em profissões «masculinas», tanto quanto se podia ser»[15]. Mulheres insubmissas que seguiram à frente do seu tempo e escolheram cursos e profissões que «profanaram» alguns dos redutos masculinos. É o caso das Engenharias e, mais especificamente, o da Engenharia Civil.

Ainda no rescaldo do centenário da implantação da República assinalou-se em Maio passado o centenário do Instituto Superior Técnico[16] e, em Janeiro do mesmo ano, festejou o seu centésimo aniversário a senhora engenheira Maria Amélia Chaves, a primeira mulher a licenciar-se naquele estabelecimento de ensino (1937). Uma senhora  lúcida e bem-humorada que nasceu com a República e nos concedeu uma longa entrevista inserida no número 25 de Faces de Eva. É em sua honra este trabalho. Ele não existiria se a não tivéssemos conhecido. O seu testemunho fez-nos reflectir nas dificuldades, nos entraves, nos preconceitos e nas discriminações que as mulheres pioneiras em profissões «masculinas» enfrentaram.

Não queremos deixar de assinalar – e lamentar – que a historiografia contemporânea continue a ser escrita no masculino e constantemente se ignorem nomes preponderantes na luta pelos direitos cívicos, legais e políticos das mulheres portuguesas. Porquê este silêncio passados cerca de quarenta anos após a acção libertadora do 25 de Abril e quando muitos desses nomes e organizações estão já estudados? Seria de esperar que obras recentes como as duas grandes Histórias de Portugal (José Mattoso, 9 v. e João Medina, 15 v.) prestassem mais atenção às mulheres. Mas só a de Medina inclui um texto de Regina Tavares da Silva – «História no Feminino: os movimentos feministas em Portugal» e, pasme-se, apenas como adenda, no último volume, misturado com a bibliografia e os índices remissivos. Dir-se-ia clandestino. Sabemos como os estudos sectoriais são importantes no campo da investigação histórica, pois, mesmo circunscritos, eles funcionam como frestas por onde a claridade flui para zonas ainda obscurecidas. São ajuda preciosa no derrube dos silêncios e dos preconceitos que continuam a ofuscar a lucidez e o conhecimento necessários para que a História no Feminino seja uma realidade.

 

II – Perguntámo-nos: seria Maria Amélia Chaves a primeira engenheira civil portuguesa? Quem a antecedeu ou precedeu nos cursos em Lisboa e no Porto? E quantas, como ela, conseguiram de facto exercer a profissão? Foi em busca de respostas que nos propusemos identificar e caracterizar minimamente as primeiras mulheres engenheiras civis portuguesas como exemplo de pioneirismo num curso que nasceu assumidamente masculino, no dealbar da implantação da República, no Instituto Superior Técnico, em Lisboa, em 1911, e na FEUP, Faculdade de Engenharia do Porto, em 1915.

a)       – As primeiras licenciadas em EC na FEUP (Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto)

Começamos por assinalar que a FEUP parece reivindicar o primado na formação das primeiras engenheiras civis oferecendo-nos dois nomes para o mesmo título: Rita de Morais Sarmento, em 1896, na Academia Politécnica do Porto, de que a FEUP é herdeira, e Virgínia de Faria Moura, já no século XX, sem menção à data final de curso. A primeira consta do site da própria faculdade, na secção «História da FEUP pelos seus grandes vultos» como tendo sido «a primeira engenheira civil do país». A segunda, na  página dos Antigos Estudantes Ilustres da Universidade do Porto[17], da responsabilidade da Reitoria da Universidade, onde também é apresentada como a «primeira engenheira civil do país».  

Quanto a Virgínia Moura tudo indica que o perfil ali traçado tenha por fonte as notícias veiculadas pela imprensa do Partido Comunista Português, de que era militante, como por exemplo a que nos transmite o jornal «Avante!» 1273, de 23 de Abril de 1998[18] que noticia a sua morte ocorrida a 19 desse mês. Os vários documentos consultados dão-na sempre como «a primeira mulher a obter o diploma de engenharia civil», embora nunca apontem qualquer data para início ou fim do curso. A própria deveria estar convencida do seu pioneirismo pois, em nota biográfica num livro por si coligido sobre as Eleições de 1969, refere ter sido «a primeira mulher portuguesa a licenciar-se em Engenharia na Universidade do Porto»[19]. Mas não deixa de ser curioso que estas citações apareçam tantas vezes repetidas e nunca corroboradas.

Consultada a Ordem dos Engenheiros, herdeira da antiga Associação dos Engenheiros Civis Portugueses, informaram-nos desconhecerem Rita Morais Sarmento e, sobre Virgínia Moura, confirmaram a sua inscrição na Ordem em 1948. Consultados, por fim, os Serviços de Documentação e Informação da Divisão de Arquivo e Museu da Faculdade de Engenharia do Porto, na pessoa do Sr. Jorge Pópulo, foi possível estabelecer quem foram as primeiras três mulheres engenheiras civis ali formadas, na primeira metade do século XX, após a Lei 410 de 1915 que transformou a antiga Escola de Engenharia de 1911 em Faculdade Técnica, a qual deu lugar à Faculdade de Engenharia pela reforma de 1926.

1ªs LICENCIADAS EM ENGENHEIRA CIVIL PELA FEUP (PORTO)

Nome

Início do Curso Final do Curso Inscrição na OEe Número
Maria da Conceição Marques Moura

Virgínia de Faria Moura  (faleceu em 19-04-1998)

M Emília de Araújo Martins Campos e Matos

03-11-194329-11-1940

20-12-1943

 21-08-194716-10-1948

28-10-1948

1948 – Nº  2820

Pensamos ter ficado claro que Virgínia Moura não foi nem a primeira engenheira civil do país, nem a primeira da Universidade do Porto. Mesmo considerando apenas as licenciadas após 1915, Maria da Conceição Moura foi quem primeiro terminou o curso, em 1947[20], tendo Virgínia Moura[21] e Maria Emília Campos e Matos terminado ambas, com diferença de dias, em 1948. Para respeitar o rigor, a Reitoria da Universidade do Porto terá de alterar os conteúdos da sua página na internet.

No entanto Virgínia Moura nem sequer precisa desse título para ser uma mulher extraordinária. Filha de uma professora primária, uma mulher culta e determinada que teve a coragem de assumir ser mãe solteira, nasceu em 1915, em Guimarães. Cresceu dentro dos valores republicanos e a sua «estreia política» ocorre ainda no liceu, quando se solidariza com a morte de um estudante universitário[22]. Antes de entrar para a Faculdade torna-se militante do Partido Comunista Português e, desde então, esteve envolvida em todas as actividades oposicionistas ocorridas até Abril de 74, tendo passado pelas cadeias políticas mais de uma dezena de vezes. A PIDE perseguiu-a constantemente e ao marido, o arquitecto António Lobão Vital, desde inícios de quarenta, mas isso não impediu que ambos se tornassem figuras preponderantes da resistência portuguesa. Trabalharam igualmente juntos, muitas vezes em projectos cedidos por arquitectos amigos – alguns que nem podiam assinar – e conseguiram abrir um escritório na cidade invicta, na Praça do Município, 309, 6º andar, Sala 6, uma morada que a polícia do regime vigiava. Como curiosidade, diga-se que no II Congresso Republicano de Aveiro, em 1969, Virgínia Moura e Lobão Vital apresentaram um trabalho conjunto designado: «As Casas dos Trabalhadores». O poeta Teixeira de Pascoais chamou-lhe «uma grande força da Natureza»[23] e Ferreira de Castro, «uma das mais corajosas mulheres de Portugal»[24]. Foi uma acérrima lutadora pela Liberdade. Uma das imprescindíveis, como diria Brecht.

Aparentemente, Rita de Morais Sarmento terá sido a primeira mulher a receber «carta de curso» ou «carta de capacidade», em 30 de Julho de 1896[25] pela Academia Politécnica do Porto, para onde terá entrado com a idade mínima exigida de 14 anos.  Contudo, os Serviços de Arquivo da FEUP não conservam no seu acervo quaisquer registos que comprovem o seu percurso académico. Consultados telefonicamente, os Serviços da Reitoria remeteram-nos para os novos conteúdos da página online, da sua responsabilidade, e que dizem estar disponível em breve.

Perguntamos: teria terminado o curso? O professor Cândido dos Santos, jubilado da Faculdade de Letras do Porto, garante-nos que sim. Mas parece ter-se apoiado apenas nos Anuários da antiga Escola Politécnica do Porto, e estes, quanto a nós, não podem ser considerados fontes primárias. É necessário que haja algumas provas escritas, uma tese de licenciatura, qualquer registo documental que ateste o seu currículo. Também não queremos pôr em causa algumas informações de familiares, que nos merecem todo o respeito, obviamente, mas continua a faltar documentação que corrobore as suas palavras. Cremos como muito possível que não tenha concluído o curso. No entanto, confiemos em que os arquivos da Reitoria do Porto conservem alguma fonte primária e a divulguem, para que as dúvidas se dissipem.

Da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira consta, de facto, uma entrada que se lhe refere nestes termos: «Ilustre senhora, uma das primeiras que foi diplomada com o curso de Engenharia Civil, nasceu no Porto em 1872 e morreu em Lisboa em 28-03-1931. Era filha do jornalista portuense Anselmo de Morais (v.) que dirigiu o jornal A Actualidade e diplomou-se em 1894, na Academia Politécnica do Porto, cidade onde as suas três irmãs mais velhas se formaram em Medicina. Casou com o engenheiro António dos Santos Lucas (v.), oficial de engenharia e lente da Escola Politécnica de Lisboa»[26]. Porém, sabemos como as informações aqui publicitadas eram, muitas vezes, cedidas por familiares ou outras entidades próximas, não sendo assinadas pelos autores. Permanece o anonimato, se bem que a obra tenha sido dirigida por grandes vultos da cultura portuguesa e brasileira.

Foi uma mulher notável, disso não temos dúvidas. O facto de ter entrado aos catorze anos para uma «escola masculina» e ter seguido um curso até aí apenas ministrado a homens, nos finais do século XIX, quando eram raríssimas as mulheres que acediam a cursos médios ou superiores, só por si, faz dela uma inquestionável pioneira. Sabemos que tuberculizou, chegou a interromper o curso e nunca exerceu a profissão. Casou, teve quatro filhas e faleceu relativamente cedo. Foi uma mulher inteligentíssima e, segundo os seus descendentes, uma preciosa auxiliar técnica do marido, o engenheiro António Santos Lucas, que instituiu a cadeira de Mecânica Racional na antiga Escola Politécnica de Lisboa, em 1908, e foi regente da cadeira de Física Matemática na Faculdade de Ciências, que se lhe seguiu em 1911, após a implantação da República. Oriunda de uma família de Aveiro com grandes tradições liberais, Rita Morais Sarmento é avó materna de António Brotas, actual professor jubilado do Instituto Superior Técnico.

Sobre Maria da Conceição Marques Moura e Maria Emília Campos Matos, desconhecemos os percursos profissionais ou sequer se ainda vivem. Contudo os seus nomes aparecem-nos em documentos da Ordem, nomeadamente na «1ª Relação dos Engenheiros que declararam concordância com a incorporação dos bens da Associação dos Engenheiros Civis no Património da Ordem dos Engenheiros»[27], o que nos diz do exercício de uma actividade profissional.

b)       – As primeiras licenciadas em EC no IST (Instituto Superior Técnico, Lisboa)

Como já referimos, o Instituto Superior Técnico festejou o seu centenário em 2011 e promoveu uma homenagem às suas mulheres[28]. Normalmente, nestas ocasiões, costuma procurar-se o primeiro aluno ainda vivo. Desta vez, o IST foi à procura das primeiras mulheres. Saudamos esta iniciativa e o esforço bem pouco comum para tirar da invisibilidade histórica estas pioneiras que ousaram entrar e permanecer numa escola estritamente masculina e onde as mulheres não eram bem-vindas. Sim, porque foram muitas as que se matricularam e acabaram por desistir. Acreditamos que esta iniciativa só foi possível porque uma mulher faz parte do seu Conselho de Gestão. Refiro-me a Palmira Ferreira da Silva, uma cientista que se preocupa com as questões de género e com a preservação da memória histórica, sensibilidade que bem poucos possuem, e a quem agradecemos a forma generosa como colaborou connosco.

Cruzando a informação cedida pelo Instituto Superior Técnico com a da Ordem dos Engenheiros, pudemos apurar as três primeiras engenheiras civis aqui formadas na primeira metade do século passado e que exerceram a profissão.

1ªs LICENCIADAS EM ENGENHARIA CIVIL PELO IST (LISBOA)

Nome

Início do Curso Final do Curso Inscrição na OE e  Número
Maria Amélia Ferreira Chaves

M da Conceição da Costa Barros Magalhães Cruz Azevedo  (faleceu em Out-2008)

Maria Teresa Abranches Pinto

1931/1932-

 1936/19371949

1952

1938 – nº 13491950

1952

Temos, assim, como primeira licenciada pelo Instituto Superior Técnico, Maria Amélia Chaves, em 1937[29]. Seguem-se-lhe Maria da Conceição da Costa Barros Magalhães Cruz Azevedo, em 1949, e Maria Teresa Abranches Pinto, em 1952. Segundo a Ordem dos Engenheiros, Maria da Conceição faleceu em 2008. Sobre Maria Teresa, sabemos ser filha de Abranches Pinto, ministro do Exército entre 1950-1954. Fez o liceu em Moçambique e veio para o Técnico em finais dos anos quarenta. Trabalhou no Ministério das Obras Públicas, no departamento de Construção de Edifícios Públicos e ainda vive. Maria Amélia completou 101 anos no passado dia 28 de Janeiro.

III – O mapa que se segue apresenta-nos a visão geral das primeiras engenheiras civis portuguesas:

Como se pode verificar, Maria Amélia Ferreira Chaves é a primeira mulher a licenciar-se em engenharia civil e, também, a primeira engenheira portuguesa. Entrou para o Instituto Superior Técnico em 1931, precisamente no ano em que os nossos engenheiros levaram a cabo o seu Primeiro Congresso Nacional, e terminou o curso em 1937. Após estágio com o Engenheiro Arantes e Oliveira (pai), entra para os quadros da Câmara Municipal de Lisboa. Tem de se impor para conseguir trabalhar fora dos gabinetes e ir para o terreno fiscalizar as obras. Manda fazer uma saia-calça especial, inventada por si, para poder andar nos andaimes sem constrangimentos. Consegue fazer-se respeitar pelos operários. Ao contrário, sente-se constantemente cerceada pelas chefias, o que a leva a pedir a demissão da Câmara nos anos quarenta. Como independente, ou por conta de outrem nunca deixou de trabalhar na construção civil, tendo realizado a última obra já perto dos noventa anos de idade, precisamente no prédio onde ainda vive. Foi a primeira mulher a inscrever-se na Ordem dos Engenheiros, em 1938, sendo neste momento a sua decana. Foi a primeira mulher a assinar projectos e a acompanhar a sua execução até final. Foi igualmente autora dos primeiros ensaios anti-sísmicos realizados no nosso país e que foram objecto de duas comunicações por si apresentadas no Primeiro Simpósio dos Sismos, realizado em Lisboa, em 1955: «Aspecto Económico da consideração da acção dos Sismos no Projecto de Edifícios»[30] e «A colaboração do engenheiro e do arquitecto no projecto de construções anti-sísmicas»[31]. Pode dizer-se que foi uma pioneira em toda a linha.[32]

 

Mulheres revolucionárias que desafiaram o seu tempo e romperam com as normas socialmente estabelecidas, num pioneirismo que registamos para Memória Futura.

(Publicado original mente em Face de Eva, 27 e transcrito com autorização da autora.)

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